terça-feira, 2 de dezembro de 2008

Hexa (escrito em 2006)

Por ocasião da Copa da Alemanha, em 2006, escrevi um "poemanifesto". Percebi como um evento muda as atitudes das pessoas, e, inclusive, como é rica a criatividade de todos. Acho bonita a euforia das festas, mas ainda há aquele resquício de loucura que preocupa a razão. O mesmo ocorre com o Carnaval: deixa todo mundo doido. Ainda tem a TV pra corroborar todo esse sentimento...
Lembro do comentário de uma ex-namorada falando que o cunhado havia deixado o filho ao léu, mas, com certeza, não havia esquecido do compromisso com o Galvão Bueno. Fiquei calado, pois, quem sou eu pra julgar?

Vi muito egoísmo do povo brasileiro nessa época. Críticas vazias às seleções estrangeiras e uma vanglorização da nossa seleção, que, sinceramente, era, sem sombra de dúvidas, muito melhor no PlayStation II.

Hexa

Cadê a pureza, meu irmão?


Deixou teu filho cagado,
a mulher ficou chateada.
Nem açougue, nem supermercado
nem ao menos tampou a privada!

Por outro lado fez um bom estrago
no crédito que tinha em cartão,
comprando em longo prazo
um uniforme da nossa seleção.

Só não contava com a mentira,
essa víbora enrustida.
Stélio da verdade
na nova vida multimídia.

Ao menos não vou ficar estressado,
nem vou mentir pro patrão.
Terça e sexta vai ter feriado.
Rico ou pobre, no altar, a televisão.

O povo gandula
falsifica novo herói.
Vilão da realidade
em tensa união.

A Copa do Mundo é isso mesmo:
um povo que não joga no seu time,
pra vencer, se derrotou.
Além da gravidade,
os gomos dos cabelos
escondem a bola-realidade.

A felicidade não é isso aí:
não é hexa-merda, Brasil.
Só pra quem quer gol,
pois, quem se cagou,
te pega na ressaca!

רפאל

segunda-feira, 1 de dezembro de 2008

Marajó

Estive recentemente em Soure, no Arquipélago do Marajó (não é ilha coisa alguma) e passei bons e já necessários momentos em família. Infelizmente não tive a companhia de minha amada, já que ela tinha um compromisso inadiável no fim de semana. De volta à Belém, falei que ia atualizar o blog e então ela me pediu para que compartilhasse as belas fotos da cidade de Soure.

Amore, eu não ia publicar, mas pedido é pedido,
Realmente, são boas fotos,
רפאל







"Enkráticos": ao Prof. Atahualpa Fernandez

Devo o princípio de minha formação moral, intelectual e profissional ao meu estimado professor de Introdução ao Direito, Dr. Atahualpa Fernandez. Esse grande advogado e jusfilósofo me ensinou tudo que eu precisei saber para amar o Direito, amar a ciência e amar a vida em geral. Nunca o agradeci pessoalmente, mas acredito que ele saiba o quanto é importante para um jovem acadêmico a participação efetiva de um grande mestre. Aliás, mestres como ele estão cada vez mais raros, dizem alguns. Eu discordo, acho que não estão ficando raros. Mestres são raros, e deve ser assim.
Meus colegas na nostálgica 1DIN1 com certeza vão recordar do que vou passar a tecer nas próximas linhas, com a certeza de que fomos privilegiados nas nossas lições introdutórias.

Então vamos lá, entrando no túnel do tempo, voltamos para 30 de agosto de 2001, aproximadamente 21h, o nosso mestre ditava as seguintes palavras:

"Uma vez que considerou o direito por um enfoque especialmente argumentativo ou discursivo, ou seja, que se considera o direito como uma atividade ou tarefa problemática cuja finalidade é a realização da justiça, mediante a interpretação e a aplicação da norma jurídica, é preciso considerar que toda a argumentação jurídica tem por objeto, sempre, uma relação jurídica. Sendo certo que toda relação jurídica nada mais é do que uma relação social qualificada como tal pela norma jurídica (direito) e que toda relação terá sempre como sujeito o indivíduo, a finalidade última do direito será sempre a de atender o incondicional respeito a liberdade ou a dignidade da pessoa ou do ser humano.
(...)
Indivíduo:
A formação ou conquista da individualidade, aqui considerada como a constituição de uma pessoa autônoma e independente, exige a condição prévia da institucionalização histórico-secular da liberdade. Significa dizer que a conquista de uma individualidade autônoma e separada pressupõe a liberdade plena do indivíduo, assegurada pelo conjunto de normas de um determinado ordenamento jurídico. Esta liberdade deve ser entendida - para o que aqui nos interessa - como "não dominação", ou seja, que o indivíduo é livre na medida em que ninguém possa interferir arbitrariamente nos seus planos de vida.
Uma vez satisfeito este pressuposto básico é preciso considerar que a conquista da individualidade exige, ademais, de dois requisitos básicos:
1. CONSIDERAR QUE O INDIVÍDUO É O RESULTADO DE UM COMPLICADO PROCESSO DE ARTICULAÇÃO ENTRE UMA ESTRUTURA MENTAL EXTREMAMENTE RICA E ESTÍMULOS PROVENIENTES DE UMA IGUALMENTE COMPLICADA VIDA SOCIAL; significa que a constituição do indivíduo depende sempre da forma como estabelece relações com seus semelhantes, ou seja, que a nossa individualidade e inteligência são essencialmente dependentes das relações sociais. É o olhar do outro que conforma e forma a nossa individualidade. Por essa razão, toda a nossa atividade mental, no que diz respeito a vida social está direcionada para entender, predizer e construir hipóteses sobre o comportamento dos demais. Por esta razão é que nossa atividade linguística está repleta de conteúdo social (fofoca).
2. CONSIDERAR QUE A CONQUISTA DA INDIVIDUALIDADE É ALGO TAMBÉM PROCESSUAL E DE GRAU, OU SEJA, QUE DEPENDE FUNDAMENTALMENTE DO PRÓPRIO INDIVÍDUO: ademais do "olhar do outro" é preciso considerar também que a conquista de um caráter virtuoso depende fundamentalmente da capacidade de todo indivíduo de automodelar-se (ou autolegislar-se). Significa dizer que, por termos uma estrutura mental extremamente rica, vivemos constantemente em conflito conosco mesmos. Logo, essa capacidade de todo indivíduo de automodelar seu próprio caráter e individualidade pressupõe que podemos ter preferências e desejos bons e maus. Ao indivíduo que consegue escolher sabiamente seus melhores desejos e harmonizar os conflitos internos de que padece, denomina-se uma pessoa "enkrática" - com grande força de vontade; ao indivíduo que não consegue escolher seus melhores desejos e harmonizar seus conflitos denomina-se uma pessoa "akrática"."

Mestres são mestres, suas palavras o tempo não apaga, pois a memória e o coração estão sempre reforçando seus traços. Prof. Atahualpa (sem o dr., como você prefere), acredito e tento, a cada dia, ser mais "enkrático" que num minuto anterior. Essa pequena ode vem de um animal político que estima por sua sapiência e longevidade.

Muito obrigado,
רפאל

Amálgama da Vida: "mindful eating", por Thich Nhat Hanh

Existem dois mundos: o mundo que vivemos e o que criamos. Num certo momento, esses dois mundos se fundiram no amálgama da vida. Essa coisa controversa, que fala, sente, cheira e escuta, que somos nós.
O segredo res in medio. Remédio. Inauguro uma série especial aos bloggeiros, que intitulo Amálgama da Vida. Do amálgama surge uma coisa totalmente nova, inexperiente de sentimentos. Do amálgama criamos a paz e o caos. O desejo não vai mais trair a vida consciente e sustentar a (in)verdade cotidiana.
Quid est veritas? Para Adorno, não pode a verdade individual sobreviver a mentira coletiva. Assim, quem mente envergonha-se, não por ter mentido, e sim por ter que participar da mentira de um mundo que lhe obriga a pregar a honestidade e a lealdade.
רפאל
Numa palestra sobre o consumo consciente, o monge e mestre budista Thich Nhat Hanh fala sobre o quanto comer pode ser extremamente violento:
"A UNESCO nos diz que 40.000 crianças morrem no mundo, diariamente, por falta de nutrição, por falta de comida. Quarenta mil crianças, diariamente! E o volume de grãos que cultivamos no ocidente é, em sua maior parte, usado para alimentar o gado criado para ser vendido como carne.
95% da aveia e 87% do milho produzidos nos Estados Unidos não é para consumo humano, mas para os animais criados para consumo. Isso representa o uso de 45% de toda a terra disponível no país.Mais da metade da água consumida nos Estados Unidos é usada na criação de animais de corte. São necessários 2500 galões de água para produzir meio quilo de carne, mas apenas 25 galões para produzir meio quilo de trigo.
Uma dieta totalmente vegetariana requer 300 galões de água por dia, enquanto que uma dieta à base de carne requer mais de 4000 galões de água por dia. Criar animais para consumo causa mais poluição da água que qualquer outra indústria nos Estados Unidos, porque os animais criados para consumo produzem 130 vezes mais excremento que o total da população humana. Isso significa 45.000 quilos por segundo. Muito dos dejetos advindos das fazendas de gado e matadouros são jogados ou fluem para dentro dos rios e córregos, contaminando as fontes de água limpa.
Nos Estados Unidos, os animais criados para consumo recebem como alimento 95% da aveia e 87% do milho cultivados. Estamos comendo o nosso país, comendo a nossa terra.
Eu fiquei sabendo que mais da metade da população come em excesso! Comer de forma consciente - mindful eating - pode ajudar a manter a compaixão em nosso coração. Uma pessoa sem compaixão não pode ser feliz, não pode relacionar-se com outros seres humanos e com outros seres vivos. Uma segunda espécie de comida que consumimos diariamente são as impressões sensoriais, a comida que comemos com os olhos, os ouvidos, a língua, o corpo, a mente. Quando lemos uma revista, nós consumimos. Quando você assiste televisão, você consome. Quando você escuta uma conversa, você consome. E esses ítens podem ser bastante tóxicos. Podem existir muitos venenos, como desejos, violência, raiva e desespero. Nós nos permitimos sermos intoxicados quando consumimos em termos de impressões dos sentidos.
E, da mesma forma, nós permitimos que nossas crianças também se intoxiquem.E o que tem resultado é a nossa doença, o nosso ser-doente, nossa violência, nosso desespero.
E, se você praticar o olhar em profundidade - meditação - você será capaz de identificar as fontes de nutrição, da comida que tem sido trazida para nós.
Portanto, toda a nação tem que praticar esse olhar profundo para a natureza do que se consome diariamente. E, o consumo consciente é a única maneira de proteger nossa nação, nós mesmos, nossa família e nossa sociedade. Temos que aprender o que produzir e o que não produzir, a fim de prover as pessoas apenas com aquilo que é nutritivo e curativo. Nós temos que evitar produzir aquilo que possa trazer guerra e desespero para o nosso corpo, para a nossa consciência, e para o corpo coletivo e para a consciência da nossa nação e da nossa sociedade."